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domingo, 7 de fevereiro de 2010

Censo 2010: diálogo com a mídia e a população é fundamental

A participação da sociedade civil e da mídia no processo de construção do Censo de 2010 é fundamental para avançar na discussão sobre o tema. Esta foi a principal conclusão tirada dos debates realizados no seminário “Censo 2010: O papel da mídia e o impacto na opinião pública sobre os desagregados de raça e etnia”, promovido pela Comissão de Jornalistas Pela Igualdade Racial (Cojira-Rio), no dia 9 de dezembro, no auditório do Sindicato (SJPMRJ).

Sensibilizar a imprensa para divulgação dos dados desagregados de raça e etnia revelados pelo Censo 2010 será um grande desafio. Para discutir como incluir a questão na agenda da mídia, os palestrantes do seminário chamaram atenção para a importância dos veículos de comunicação começarem a se preparar imediatamente, inclusive para compreender os motivos das desigualdades sociais que devem ser apresentadas pela pesquisa nacional.

Atenção para divulgação
A representante da TV Brasil, a jornalista da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), Marcia Manga, avaliou como fundamental que a própria assessoria de imprensa do IBGE destaque os dados desagregados. E lembrou que documentos devem ser enviados às redações com informações da pesquisa, antes da divulgação oficial do censo.
“Receberemos um release do IBGE com vários dados e com base nesse documento prepararemos as reportagens. Caso a assessoria de imprensa encubra esses números, podemos não prestar atenção e não divulgar”.
Embora avalie que a divulgação do perfil racial da população possa ajudar a explicar desigualdades, Marcia comentou que para os jornalistas que não acompanham a complexa temática racial no país, esse trabalho pode ser mais difícil. “Temos que vender uma pauta, uma ideia para o noticiário. E para quem não é engajado, observar a relevância desses dados é mais complicado”, reconheceu.

Abordagem qualificada
A mediadora do debate, a jornalista da Cojira-Rio, Angélica Basthi, aproveitou os comentários da representante da TV Brasil para destacar que desde agora as redações precisam começar a tratar da questão, promovendo um processo de conscientização sobre a auto-identificação.

“Não podemos contar apenas com a assessoria do IBGE. Não é só receber um release, ir lá e cobrir. Devemos promover uma pauta qualificada. Nosso objetivo é ter um diálogo permanente. E quando os repórteres receberem essa pauta, que tenham conteúdo para uma abordagem qualificada”, explicou.

Questionada sobre os esforços da TV Brasil para ampliar os espaços de participação social e ampliar a pauta de maneira que contemple os diversos segmentos sociais, Marcia Manga disse que a EBC ainda está buscando uma fórmula. “Este caminho não está fechado, mas temos um potencial. Ninguém sabe ainda o que vai ser. A pessoas estão bem intencionadas e estamos trilhando uma diretriz. Por isso, estou aqui”.

Ao comentar a participação da imprensa na divulgação dos dados do Censo 2010, a coordenadora do Programa Gênero, Raça e Etnia do Unifem, Maria Inês Barbosa, também destacou a importância do papel da mídia. Cobrou campanhas de conscientização sobre a reinclusão das variáveis raça e etnia no questionário base, de maneira que as pessoas respondam conscientemente as perguntas dos recenseadores. E fez uma provocação aos veículos de comunicação para “dialogar com os desagregados”, de maneira a questionar as estruturas por trás das diferenças entre as raças, que deverão ser reveladas pelo censo.

Amostragem prejudicada
Suzana Blass, presidente do SJPMRJ, fez a abertura oficial do encontro. O debate começou com a exposição do pesquisador do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), José Luiz Petruccelli, que defendeu a reinclusão das variáveis “raça e etnia” nos formulários-base da pesquisa, antes realizada somente por amostragem. De acordo com o pesquisador, a medida permitirá o aprofundamento dos estudos sobre o perfil étnico-racial da população, com foco na implementação de políticas públicas.

A historiadora Wania Santanna, integrante do Grupo de Trabalho Afrodescendentes das Américas (que reúne líderes e especialistas responsáveis pela discussão da Rodada de Censos de 2010 na região), questionou os avanços sugeridos pelo IBGE. Para ela, a mudança na metodologia do instituto prejudica a população negra que pode ficar sub-representada.

“A categoria de cor e raça foi historicamente construída. A [categoria] idade eu sei qual é, pois não foi desqualificada da mesma maneira que raça e etnia”, afirmou, acrescentando que “se é verdade que amostragem representa o universo, estou satisfeita. Nesse caso, com essa mudança, [os dados] podem ser um instrumento político contra nós”, avaliou.
Resposta a críticas

Wania Santanna comentou ainda sobre o risco da reinclusão receber um tratamento negativo na mídia. “Estou convencida de que os meios de comunicação vão tratar da forma mais indigna o que é a identidade das pessoas”, alertou.

Petruccelli respondeu às críticas reforçando os benefícios de informações mais detalhadas nas pesquisas estatísticas. “Isso permitirá a desagregação geográfica que a gente quiser. Poderemos estudar o perfil racial até de um bairro”, afirmou o pesquisador. “Uma amostra representa o universo. Se o resultado do universo não representa a amostra, então está desqualificado. Só se faz estudos amostrais para economizar tempo e dinheiro”, completou.

A coordenadora do Programa Gênero, Raça e Etnia do Unifem (Fundo das Nações Unidas para a Mulher) Brasil e Cone Sul, Maria Inês Barbosa, afirmou que vai propor uma reunião para esclarecer as alterações na pesquisa convidando representantes da sociedade, do IBGE, da Secretaria Especial de Políticas de Igualdade Racial (Seppir), da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM) e dos membros brasileiros do Grupo de Trabalho Afrodescendentes das Américas responsáveis pela discussão sobre o censo no país.

Resultados diferentes
Maria Inês ponderou que as informações desagregadas são importantes para os governos “caracterizarem” suas populações e implementarem políticas de igualdade racial, mas concordou que o Censo 2010 pode apresentar resultados diferentes do esperado.

“Temos que sentar e buscar saber como está sendo pensada a capacitação dos recenseadores em relação a essas questões. Chamo atenção, inclusive da mídia, para divulgar mais a questão”.

De acordo com Maria Inês, “pelo menos 11 países da Américas vão realizar censos em 2010 que devem incluir pela primeira vez a pergunta sobre raça e etnia. Isso é parte de um processo de luta, resistência e determinação de ativismo histórico da região”, afirmou, referindo-se à Conferência Mundial contra o Racismo, realizada em 2001, em Durban (África do Sul). “Apesar das fragilidades, não é algo que caiu do céu!”, afirmou.

Texto: Isabela Vieira (Cojira-Rio/SJPMRJ)

Fonte: http://www.jornalistas.org.br/noticias.php?idn=1220

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